Os Efeitos da Aposentadoria Especial no Contrato de Trabalho em Funções com Exposição a Agentes Insalubres e a Responsabilidade do Empregador

  • Em 5 de julho de 2023

A aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física por um determinado período de tempo, de acordo com a gravidade da exposição, conforme disposto no art. 57 Lei nº 8.213/91.

Por sua vez, o Decreto 3.048/99, com as alterações trazidas pelo Decreto nº 10.410/2020, prevê no art. 64 que a aposentadoria especial será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este último somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que comprove o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou a associação desses agentes, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação.

O § 1º do referido dispositivo dispõe, ainda, que a efetiva exposição a agente prejudicial à saúde configura-se quando, mesmo após a adoção das medidas de controle previstas na legislação trabalhista, a nocividade não seja eliminada ou neutralizada. E, que a exposição aos agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde deve superar os limites de tolerância estabelecidos segundo critérios quantitativos ou estar caracterizada de acordo com os critérios da avaliação qualitativa de que trata o § 2º do art. 68.

O art. 68, por sua vez, impõe que, para fins de aposentação especial, a relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física deve constar necessariamente do Anexo IV, tabela que traz a relação de agentes insalubres para fins de caracterização da atividade especial.

O custeio das aposentadorias especiais está previsto no § 6º do art. 57 da Lei nº 8.213/91. Segundo este dispositivo, o benefício será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. 

A concessão de aposentadoria, independentemente se especial ou não, não é causa de rescisão do contrato de trabalho, conforme Orientação Jurisprudencial TST/SDI-1 361, permanecendo o contrato de trabalho ativo, até a efetiva rescisão por iniciativa do empregado ou do empregador. 

No entanto, quando a aposentadoria é especial, a continuidade do trabalho no mesmo ambiente com exposição a agentes nocivos, previstos no Anexo IV do Decreto 3048/99, não é permitida. Conforme se extrai do § único do art. 69 do decreto 3.048/99 e no art. 254 da IN/INSS nº. 77 de 2015.

Depreende-se da leitura desses dispositivos, que se trata de uma relação exclusiva entre o segurado da previdência social e o INSS. Isso porque, nos referidos dispositivos existe a proibição do INSS de retorno às atividades que tenham exposição aos agentes nocivos previstos no anexo IV. Na hipótese de descumprimento da determinação, existe a incumbência do INSS de notificar o segurado da cessação do pagamento de sua aposentadoria.

De tal sorte que emerge dessa hermenêutica legal a obrigação do empregado comunicar ao INSS quanto ao seu retorno ao trabalho em exposição aos agentes nocivos capazes de ensejar a concessão de aposentadoria especial e do INSS fiscalizar o cumprimento dessa regra. Entretanto, nada impede que a empresa estabeleça norma coletiva ou individual prevendo tal obrigação.

Assim, não é autorizado o segurado permanecer trabalhando em ambiente com exposição a agente nocivo, mesmo que seja em outra empresa e se constatado que permanece trabalhando exposto, cessará o pagamento da aposentadoria.

Ocorre que, atualmente, o único meio do empregador tomar ciência da concessão da aposentadoria é através da plataforma da Previdência Social, acessada com o CNPJ raiz e senha, cujas informações permanecem disponíveis temporariamente, não existindo outra forma de notificação, inclusive, a própria autarquia não fornece as informações acerca de requerimentos e andamento processual ao preposto do empregador, por força da Lei Geral de Proteção de Dados. 

Por outro lado, inexiste previsão legal que obrigue a comunicação do INSS por parte do empregador em relação a continuidade das atividades laborais com exposição a agentes nocivos após a concessão da aposentadoria especial. 

Entretanto, uma vez ciente da concessão da aposentadoria especial e pela regra básica do direito de que ninguém pode alegar o desconhecimento da lei, e estando previsto no ordenamento jurídico a incompatibilidade da aposentadoria especial e a continuidade da atividade insalubre, prevista no anexo IV do Decreto 3048/99, não é recomendável a manutenção do empregado no cargo em condições nocivas, assim como é recomendável a imediata comunicação do INSS quando da ciência desse tipo de ocorrência.

Não existe no ordenamento jurídico vigente a previsão de penalização da empresa em razão da ausência de comunicação da autarquia previdenciária em relação ao conhecimento da situação específica do aposentado especial que permaneça na atividade com exposição a agentes nocivos.

Assim, ante a ilegalidade na conduta do empregado,  ante o disposto nos art. 254 da IN/INSS nº 77 de 2015,  § único do art. 69 do decreto 3.048/99 e tema 709 de repercussão geral decidido pelo Supremo Tribunal Federal, o empregador tem, na nossa ótica, o dever social de informar o INSS da irregularidade constatada. 

Destaque-se que, além da penalidade de cessação do benefício, o empregado poderá ser responsabilizado por apropriação indevida, já que não poderia permanecer no ambiente de trabalho estando em gozo de aposentadoria especial, conforme previsto no art. 168 do Código Penal. 

Quando se trata de seguridade social devemos sempre ter como premissa que será o interesse público e coletivo em detrimento do individual, princípio norteador divergente do que é aplicável ao Direito do Trabalho, que sempre considerará aplicável ao empregado a norma/situação mais favorável ao empregado. 

O bem jurídico tutelado com a concessão da aposentadoria especial é garantir que não haja exposição prolongada do trabalhador aos agentes nocivos, que perde seu objeto social quando o empregado age ilegalmente, mantendo-se ativo em suas atividades laborais, em tese prejudiciais à saúde, cumulando com a aposentadoria especial, causando prejuízo ao erário público. 

Assim, considerando a boa fé objetiva do empregador e a necessidade de sua demonstração por meio de ações concretas, que tomou conhecimento da aposentadoria especial, a omissão da informação para o INSS pode ser considerada futuramente como a concorrência para o ato ilícito do empregado. 

Então, para evitar discussões futuras, é recomendável a notificação do INSS quanto ao recebimento pelo empregado da aposentadoria especial quando o empregado se mantiver trabalhando em ambiente com exposição a agentes nocivos.

O fato do empregado não poder trabalhar em ambiente com exposição aos agentes nocivos, não traz impacto imediato ao empregador, sendo de responsabilidade do empregado a omissão da informação tanto para o empregador quanto para o INSS.

No mais, a empresa não tem a obrigação de realocar o empregado para outra função. A relação de segurado é somente entre o empregado e o INSS, não sendo de responsabilidade do empregador a modalidade de aposentadoria que será pleiteada pelo empregado. 

A única possibilidade jurídica que vincula o empregador é nos casos de reabilitação profissional, que se aplica somente nos casos em que o empregado teve redução de capacidade laboral, foi afastado do trabalho, e deverá ser realocado em outra função, compatível com a capacidade laborativa reduzida, nos termos do art. 62 da Lei nº. 8.213/91.

Como forma de mitigação desse risco e em havendo interesse da empresa na manutenção do empregado, pode ser facultado ao mesmo a escolha em permanecer na função desde que comunique formalmente o INSS, requerendo a suspensão temporária do pagamento do benefício enquanto perdurar o vínculo empregatício.

Em qualquer hipótese, é sempre prudente que o empregador promova a educação de seus colaboradores por meio de informativos, treinamentos e palestras, enquanto prática ESG, especificamente na sua dimensão social, inclusive, manter a comunicação de forma clara aos colaboradores expostos aos agentes nocivos quanto aos impedimentos de manutenção no emprego nas mesmas condições em caso de aposentação especial. 

 

Legendas “Zero” Juridiquês:

O texto trata-se de um alerta às empresas sobre o efeito da aposentadoria especial no contrato de trabalho, já que é ilegal o empregado se manter trabalhando com exposição a agentes nocivos à saúde e receber pela aposentadoria especial.

O INSS deve ser comunicado da irregularidade para que tome a providência que entender cabível, devendo o empregador manter política social voltada para o treinamento dos empregados quanto a incompatibilidade entre o trabalho nocivo e o recebimento da aposentadoria especial. 

  1. Orientação Jurisprudencial: Posicionamento adotado e publicado por Tribunal do Trabalho a respeito de determinado tema jurídico, com a finalidade de buscar a uniformidade das futuras decisões sobre matéria.
  2. Concessão da Aposentadoria: Ato do INSS de conceder/deferir a aposentadoria;
  3. Agentes Nocivos: São elementos previstos no Decreto 3048/99 que geram condições de trabalho que prejudicam a saúde ou a integridade física e mental dos trabalhadores.
  4. Mitigação: Reduzir ou aliviar;
  5. Capacidade Laboral: É o estado físico e mental que define se o empregado está em condições para exercer o trabalho.

 

 

Como o PMA pode ajudar? O PMA tem expertise já consolidada no consultivo e contencioso trabalhista e previdenciário empresarial, o que possibilita uma análise multidisciplinar e prática do caso concreto, sem juridiquês. Assim, o PMA pode auxiliar as empresas na gestão de benefícios de aposentadoria, para estar ciente desde o primeiro dia da aposentadoria, bem como na elaboração de políticas ESG.

 

 

Por Maurício Pallotta Rodrigues é advogado empresarial atuante nas áreas trabalhista individual e coletiva e previdenciária, sócio fundador do escritório Pallotta, Martins e Advogados, professor, palestrante, instrutor in company, mestre em Direito do Trabalho e Seguridade Social pela Universidade de São Paulo e especialista em Direito Previdenciário Empresarial, autor da obra “Contratação na multidão e a subordinação jurídica” pela editora Mizuno, além de outros capítulos de livros e artigos em sites e revistas especializadas.

 

 

Beatriz Moraes é advogada atuante nas áreas trabalhista e previdenciária empresarial, sócia do escritório Pallotta, Martins e Advogados, instrutora in company, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Mackenzie.

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