O SEGURO GARANTIA E A DIFICULDADE DE ANÁLISE DO PRESSUPOSTO RECURSAL PELO TRIBUNAL

  • Em 16 de setembro de 2021

Após novembro de 2017 passou a ser permitida a substituição do depósito recursal por seguro garantia, conforme disposto no §11, do art. 899 da CLT. No entanto, não constou na legislação quais seriam os requisitos formais da apólice, o que que veio a ser regulamentado depois pelo Ato Conjunto do TST e CGJT nº. 1 de 2019.

 

Dentre os requisitos estabelecidos, constou no art 5º que quando do oferecimento da garantia, o recorrente deve apresentar a apólice do seguro, comprovação do registro da apólice na SUSEP, bem como a certidão de regularidade da sociedade seguradora perante a SUSEP.

 

Ocorre que, conforme os Termos e Condições da Circular SUSEP nº. 477/2013 e seus anexos, processo SUSEP nº. 15414.902037/2013-11, a SUSEP disponibilizará a certidão de registro da apólice somente 7 dias úteis após o registro, o que tem causado algumas distorções e dificuldade no processamento de recursos.

 

Ressalte-se que o Ato Conjunto cita “comprovação de registro na SUSEP”, portanto, mesmo que tempestiva a apólice, datada dentro do prazo recursal, a certidão respectiva de registro somente será emitida em data posterior, nos limites temporais estabelecidos pela SUSEP. Então, somente sendo possível a sua juntada pelo Recorrente quando da sua disponibilização pelo órgão competente.

 

A apresentação da certidão de registro após a disponibilização da SUSEP, quando tempestivo seu registro, não deveria ser óbice ao conhecimento das razões recursais, na medida em que interpretação diversa culminaria com a inviabilização da utilidade da ferramenta inserida pela Reforma de 2017, já que o prazo de emissão do registro depende de ato de terceiro alheio à relação processual.

 

No entanto, quando da análise dos pressupostos recursais, na prática, tem havido grande número de decisões nos Tribunais pelo seu não conhecimento de recursos, sem que se conceda, inclusive, o prazo previsto no art. 1.007 do CPC, aplicável ao Processo do Trabalho por força do disposto no art. 8º da CLT, bem como no art. 10º da Instrução Normativa nº. 39/2016 do TST, exatamente em razão do prazo de registro da apólice.

 

O prazo em questão é o disposto no §7º, em que se tratando de vício sanável, deverá o Relator intimar o recorrente para que regularize o preparo recursal, sanando o vício no prazo de 5 (cinco) dias.

 

Ressalte-se que as apólices de seguro são documentos extensos, divididos entre as obrigações da seguradora em relação ao serviço prestado e as obrigações entre a contratante e a seguradora.

 

Ocorre que, quando da análise da apólice, tem sido corriqueira a interpretação incorreta do documento, bem como em sentido contrário ao que dispõe a própria SUSEP sobre o tema.

 

Conforme o Ato Conjunto, deve ser apresentado o registro da apólice na SUSEP, cuja certidão será emitida somente dentro do prazo de 7 dias úteis, então se a Recorrente registrar a apólice no seu último dia do prazo recursal, a garantia deve ser aceita pelo Tribunal, posto que foi solicitado o registro dentro do prazo recursal.

 

Além disso, uma outra situação que nos deparamos recentemente no TRT2, foi o não conhecimento do Recurso Ordinário, em razão da interpretação de que a atualização monetária prevista na apólice não era aplicável à Justiça do Trabalho.

 

No entanto, o índice citado pelo Tribunal no v. acórdão se tratava, na verdade, das obrigações entre a contratante e a seguradora, sem relação com as obrigações da seguradora quanto à garantia no processo, a qual estava em conformidade com as regulamentações do Ato Conjunto e da SUSEP e previsto nos tópicos anteriores da apólice.

 

Isso tem gerado a necessidade da prática de atos processuais adicionais, como embargos  de declaração com efeito modificativo para demonstrar que a garantia e a apólice estariam dentro dos parâmetros legais, em total descompasso com os princípios da economia processual, celeridade e primazia do julgamento de mérito..

 

Em caso concreto, no processo nº 1000368-62.2020.5.02.0049, a decisão do Tribunal foi por acolher os Embargos de Declaração com Efeito Modificativo para conhecimento do Recurso Ordinário, com reforma da sentença, em decisão totalmente favorável à parte recorrente, a qual estava em primeira análise vendo seu recurso não ser conhecido em razão de suposto vício formal da apólice garantidora do depósito recursal.

 

Assim, a análise incorreta feita muitas vezes nos Tribunais acaba desestimulando os recorrentes na utilização do seguro garantia, o qual pode ser instrumento importante para as empresas, em especial em cenários de crise financeira, para preservação de caixa, da própria existência do recorrente e até mesmo para a preservação de empregos. O depósito recursal atualmente é de R$ 10.986,80 (dez mil novecentos e oitenta e seis reais e oitenta centavos) para os recursos ordinários e R$ 21.973,60 (vinte e um mil novecentos e setenta e três reais e sessenta centavos) para os Recursos de Revista..

 

Outro aspecto que deveria ser melhor observado pelos Tribunais é a concessão do prazo de 5 (cinco) dias para regularização, disposto no citado art. 1.007 do CPC, posto que, conforme relatado anteriormente, o chamamento da parte para sanar o vício não é facultativo e sim obrigatório pelo julgador após a reforma de 2015 do CPC.

 

Em razão da dificuldade enfrentada para conhecimento dos Recursos Ordinário com a utilização do depósito garantia, é de suma importância o domínio da regulamentação tanto pelo TST quanto pela SUSEP, para que seja possível viabilizar o aceite da apólice nesses casos. Se possível, deve ser demonstrada de forma minuciosa a regularidade da garantia quando abordado o preenchimento dos pressupostos extrínsecos nas razões recursais, seja para evitar a necessidade da prática de atos futuros visando o recebimento do recurso ou para exatamente viabilizar essa discussão no caso de uma interpretação equivocada no juízo de admissibilidade.

 

Dito isso, tanto a demonstração de regularidade do seguro-garantia nas razões recursais, quanto nos eventuais embargos de declaração e recursos contra decisão de não conhecimento, são essenciais para garantir que os Tribunais conheçam dos recursos  interpostos, ainda mais considerando que do acórdão de não conhecimento de recurso ordinário não caberá Recurso de Revista, uma vez que a violação é de Instrução Normativa e/ou Ato Conjunto, que regulamentaram a apresentação do seguro-garantia,  não contempladas nas violações previstas no art. 896 da CLT, o que demandaria uma discussão muito mais difícil relacionada com a inviabilização de ampla defesa e contraditório.

 

Beatriz Moraes é advogada atuante nas áreas trabalhista e previdenciária empresarial, sócia do escritório Pallotta, Martins e Advogados, instrutora in company, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Mackenzie.

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