Tributação e Doações em Tempos de Calamidade

  • Em 13 de maio de 2024

A exemplo do que ocorreu no período da pandemia do COVID, o reconhecimento do estado de calamidade pública que o estado do Rio Grande do Sul atravessa, em razão das chuvas intensas, comove a sociedade em geral para o enfrentamento da crise, sendo comum o poder público flexibilizar algumas obrigações legais.

A legislação tributária prevê uma série de requisitos para a dedutibilidade de tributos sobre as doações realizadas pelas empresas em favor das entidades civis, sem fins lucrativos, por exemplo.

Além dessa legislação já vigente, o Estado emite regulamentações visando a dispensa de algumas obrigações acessórias para o rápido atendimento às necessidades da sociedade. Com base nisso, apontamos as principais disposições sobre os benefícios fiscais para doações realizadas por empresas para ajuda em situações de calamidade pública.

IRPJ e CSLL
As empresas podem doar qualquer valor, todavia, só é possível lançar como despesa dedutível para efeitos de apuração do IRPJ e da CSLL (para empresas do lucro real) aquelas feitas para OSCIP´s, entidades civis, instituições de ensino e pesquisa, fundos do idoso, criança (existem requisitos que devem ser consultados para cada situação).

No caso de entidades civis, as doações, quando em dinheiro, serão feitas mediante crédito em conta corrente bancária diretamente em nome da entidade beneficiária. Além disso, a pessoa jurídica doadora manterá em arquivo, à disposição da fiscalização, declaração, segundo modelo aprovado pela Secretaria da Receita Federal, fornecida pela entidade beneficiária, em que esta se compromete a aplicar integralmente os recursos recebidos na realização de seus objetivos sociais, com identificação da pessoa física responsável pelo seu cumprimento, e a não distribuir lucros, bonificações ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob nenhuma forma ou pretexto.

ICMS e IPI
De acordo com a legislação vigente do ICMS e do IPI, a saída de produto ou mercadoria de estabelecimento comercial ou industrial configura o fato gerador desses impostos, não levando em consideração o motivo da respectiva saída. Assim, as doações de bens são consideradas saídas comuns para fins de tributação do ICMS e do IPI.

No entanto, em relação ao ICMS, o Convênio ICM 26/1975 estabelece que estarão isentas do ICMS:

(1) as saídas de mercadorias, em decorrência de doações a entidades governamentais, para assistência a vítimas de calamidade pública, assim declarada por ato expresso da autoridade competente;

(2) as saídas de mercadorias, em decorrência de doações às entidades assistenciais reconhecidas de utilidade pública, que atendam aos requisitos do artigo 14 do CTN.

Especificamente sobre as doações que saem Estado de São Paulo, para vítimas de calamidade pública, são isentas do ICMS/SP, conforme determina o artigo 83 do Anexo I do RICMS/SP – Regulamento do ICMS/SP, quando a doação é feita à “entidade governamental ou à entidade assistencial reconhecida como de utilidade pública e que atenda aos requisitos previstos no artigo 14 do Código Tributário Nacional, portadora do “Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos” fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, para assistência a vítimas de calamidade pública declarada por ato de autoridade competente, bem como a prestação de serviço de transporte daquela mercadoria.”

Sendo caso de isenção, não se exigirá o estorno do crédito relativo à entrada das mercadorias, ou dos respectivos insumos, objeto das saídas para doações a entidades, antes referidas e a isenção será extensiva ao ICMS sobre a prestações de serviços de transporte daquelas mercadorias.

Em caráter de emergência, sobre a atual situação de calamidade do RS, o Conselho Nacional de Política Fazendária ­(CONFAZ) e a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil emitiram Ajuste SINIEF nº 09, de 07/05/2024, que estabelece que as remessas de mercadorias coletadas de terceiros, doadas para assistência a vítimas de calamidade pública em decorrência das enchentes, temporais e inundações ocorridas no Estado do Rio Grande do Sul, estão dispensadas da emissão de documento fiscal na operação e na prestação de serviço de transporte desde que acompanhada da declaração de conteúdo conforme anexo do próprio Ajuste e seja destinada ao Governo do Estado, Defesa Civil, Prefeituras Municipais e as entidades beneficentes sem fins lucrativos do Estado do Rio Grande do Sul.

As mercadorias próprias remetidas deverão ter emissão de Nota Fiscal Eletrônica ­ NF­e ­ com Código Fiscal de Operações e de Prestações ­ CFOP ­ 5.910 ou 6.910 (Remessa em bonificação, doação ou brinde), conforme o caso.

A base de cálculo do IPI nos casos de doações e cessões gratuitas de bens ou mercadorias será o valor da operação de que decorrer a saída do estabelecimento, conforme previsto no artigo 190, inciso II, Decreto nº 7.212 de 2010, acrescido de frete e demais despesas acessórias, cobradas ou debitadas pelo contribuinte ao destinatário.

PIS/COFINS
No caso do PIS/COFINS, para a empresa doadora, conforme a própria RFB sustenta na Solução de Consulta nº 136, de 21/08/2012, sobre o valor da doação não há incidência das Contribuições, por não configurar receita, uma vez que a doação está desvinculada de uma operação de venda.

ITCD
Em relação às doações, há incidência do imposto de competência estadual ITCD (Imposto sobre doação), tendo que avaliar a legislação de cada estado.

Especificamente sobre o estado do Rio Grande do Sul, há previsão de isenção do imposto, conforme Lei Estadual 8.821/1989, artigo 7º, III, quando o donatário for a União, Estado do Rio Grande do Sul ou município deste Estado.

Assim, em caso de doação por empresa domiciliada no Estado do Rio Grande do Sul, para o Estado ou para algum dos seus Municípios, qualquer valor doado ficará isento. Porém, para doações para qualquer pessoa, empresa e entidade, o valor doado fica limitado a R$ 3.450,00 (para o ano de 2024).

 

PANORAMA
O Brasil carece de um regime tributário específico na ocorrência de situação de calamidade pública, dependendo de poucas previsões legais sobre benefícios fiscais em caso de operações de doações pela sociedade em geral.

Na ocorrência de fatos de calamidade pública, como a atual vivida no Rio Grande do Sul, ou mesmo da experiência com a Pandemia, as medidas regulatórias dos órgãos públicos limitam-se a diferimento de prazos para recolhimento do tributos, sendo inexpressivos os reais benefícios fiscais para doação por empresas a entidades civis sem fins lucrativos e aos órgãos públicos que, na esfera federal, só beneficiam muito timidamente as pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real.

Algumas regulamentações costumam auxiliar o desentrave de burocracias a necessidades específicas, dando destaque à ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres que, por meio da Portaria DG 110/2024 atribuiu atendimento prioritário e dispensou dos procedimentos de fiscalização nos Postos de Pesagem Veicular em todas as rodovias federais para os veículos que transportam donativos para o Rio Grande do Sul, bastando mera declaração verbal pelo motorista.
Tudo isso gera necessidade de reflexão sobre os limites do poder estatal em situações de emergência ante os controles institucionais para reavaliar o papel do Estado na sociedade, tendo o direito tributário um relevante papel.

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