O PL 245/2019 e a bomba fiscal que pode impactar as empresas

  • Em 11 de abril de 2023

A aposentadoria especial, tal qual é concebida hoje em nosso ordenamento jurídico, é derivada da previsão constitucional inserida no inciso II do § 1º do art. 201 da CF. Segundo o qual, somente por meio de Lei Complementar é facultado ao legislador estabelecer a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios em favor dos segurados cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes.

 

Cumpre-se esclarecer que, conforme o texto do art. 57 da L. 8.213/91, a aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física por um determinado período de tempo, de acordo com a gravidade da exposição.

 

E, por sua vez, o Regulamento da Previdência, com as alterações trazidas pelo Decreto nº 10.410/2020, prevê no art. 64 que a aposentadoria especial será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este último somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que comprove o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou a associação desses agentes, de forma permanente, não ocasional nem intermitente.

 

O § 1º do referido dispositivo dispõe, ainda, que a efetiva exposição a agente prejudicial à saúde configura-se quando, mesmo após a adoção das medidas de controle previstas na legislação trabalhista (EPC’s e EPI’s), a nocividade não seja eliminada ou neutralizada. E, que a exposição aos agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde deve superar os limites de tolerância estabelecidos segundo critérios quantitativos ou estar caracterizada de acordo com os critérios da avaliação qualitativa de que trata o § 2º do art. 68.

 

O art. 68, por sua vez, impõe que, para fins de aposentação especial, a relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física deve constar necessariamente do Anexo IV, tabela que traz a relação de agentes insalubres para fins de caracterização da atividade especial.

 

Importante frisar que, tanto no texto constitucional, quanto no Decreto 3.048/99, está prevista a vedação do enquadramento de segurados para fins de percebimento de aposentadoria especial em razão de pertencimento a determinada categoria profissional ou ocupação.

 

Igualmente, em que pese estar previsto no art. 58 da Lei nº 8.213/91 a possibilidade de aposentação especial em razão da exposição do segurado a condições especiais que prejudiquem a sua integridade física, o que poderia dar falsa conotação de que a periculosidade poderia dar direito ao enquadramento excepcional para fins de percebimento de benefícios em condições diferenciadas aos demais segurados da previdência, pela hermenêutica jurídica somada ao princípio da legalidade estrita a que estão sujeitos os órgãos da administração pública, no que se inclui o INSS, não há no ordenamento rol discriminando as atividades ou os agentes perigosos para fins de aposentação especial, pelo contrário, trataria-se de inovação em relação ao texto constitucional.

 

Neste contexto, o PL 245 de 2019 e suas suas emendas, dentre outras coisas, sugerem a possibilidade do enquadramento de determinadas atividades e categorias para fins de aposentação especial, bem como dispõe sobre a equiparação de algumas atividades em que há risco à integridade física às atividades de efetiva exposição aos agentes nocivos, em outras palavras, aposentação especial por periculosidade.

 

Além das questões atinentes à constitucionalidade dessas previsões por meio de lei complementar, já que no art. 201, § 1º, II da CF estabelece que apenas critérios diferenciados de idade e tempo de contribuição poderiam ser previstos para os segurados “cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação”, é preciso se atentar para o fato de que esse tipo de previsão acarretará também no aumento da carga fiscal-previdenciária para as empresas.

 

O custeio das aposentadorias especiais está previsto no § 6º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, segundo o qual, o benefício será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

 

Assim, caso seja aprovado o referido projeto e emendas nos pontos que tratam do retorno da possibilidade de enquadramento de atividades e categorias profissionais para fins de percebimento de aposentadoria especial, vamos estar diante de um cenário muito parecido com aquele desenhado pela Suprema Côrte na decisão proferida no Agravo em Recurso Extraordinário 664.335 em 2014, na qual passou adotar o entendimento de efetiva exposição por presunção em relação ao ruído.

 

Neste caso, ao contrário do que foi estabelecido em relação aos demais agentes nocivos químicos, físicos e biológicos, em que a questão fática é relevante para fins de determinação do direito à aposentadoria especial, ou seja, se avalia se as funções exercidas pelo segurado efetivamente causaram-lhe ou poderiam ter causado prejuízos a saúde ou integridade física, para o ruído a análise do Supremo é estritamente jurídica e presumida.

 

No caso do restabelecimento por meio de lei complementar da possibilidade do enquadramento de categorias profissionais e atividades específicas para fins de concessão de aposentadoria especial, a demonstração da efetiva neutralização ou eliminação da nocividade dos agentes a que essas categorias estejam submetidas de fato no exercícios de suas funções, com base no art. 64, § 1º-A e § 2º do Decreto nº 3.048/99, será totalmente inútil, na medida em que bastaria a comprovação do exercício de determinadas atividades contempladas no rol do novo ordenamento jurídico para que o segurado passasse a ter direito imediato ao benefício e, consequentemente, geraria para o empregador o dever de recolhimento do adicional do RAT sobre a remuneração de todos os seus colaboradores enquadrados em determinadas atividades ou categorias.

 

Racional parecido deve ser aplicado no caso de equiparação da periculosidade para fins de aposentação especial, já que não há, em tese, equipamento capaz de neutralizar riscos à integridade física do trabalhador, gerando também o dever do empregador pagar o adicional para todos os colaboradores que exerçam as atividades descritas como perigosas.

 

A verdade é que se esse PL 245/19 for aprovado e sancionado com as emendas sugeridas para acrescentar o enquadramento por categorias profissionais e prever a equiparação da periculosidade para fins de concessão de aposentadoria especial, além de haver uma afronta direta ao texto constitucional, acaba tornando a referida norma jurídica uma verdadeira bomba fiscal a ser suportada pelas empresas.

 

 

Por Maurício Pallotta Rodrigues é advogado empresarial atuante nas áreas trabalhista individual e coletiva e previdenciária, sócio fundador do escritório Pallotta, Martins e Advogados, professor, palestrante, instrutor in company, mestre em Direito do Trabalho e Seguridade Social pela Universidade de São Paulo e especialista em Direito Previdenciário Empresarial, autor da obra “Contratação na multidão e a subordinação jurídica” pela editora Mizuno, além de outros capítulos de livros e artigos em sites e revistas especializadas.

 

 

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