TRT da 10ª Região (DF/TO) afasta justa causa aplicada a trabalhador flagrado portando maconha no intervalo do trabalho

  • Em 23 de junho de 2020

Por unanimidade, a Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) reverteu a justa causa para demissão aplicada a um trabalhador que foi flagrado portando maconha durante seu horário de intervalo da jornada de trabalho. O uso ou porte de maconha no horário do intervalo intrajornada, fora do ambiente de trabalho, sem outros reflexos diretos no contrato de trabalho, não pode ser apenado com dispensa por justa causa, frisou o relator do caso, desembargador Mário Macedo Fernandes Caron, para quem o empregador poderia ter aplicado outra penalidade, ou mesmo procedimentos educativos “no intuito de resgatar o profissional”.

Consta dos autos que o trabalhador foi flagrado, junto com mais dois colegas, portando uma pequena quantidade de maconha durante o horário de intervalo de sua jornada de trabalho. Diante do que considerou um mau procedimento, a empresa o demitiu por justa causa, com base no artigo 482 (alínea `b`) da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ele acionou a Justiça do Trabalho buscando reverter a justa causa, mas o juízo da 8ª Vara do Trabalho de Brasília negou o pleito.

Sem penalidade

No recurso ao TRT 10 em que insistiu na reversão da justa causa, o profissional alegou que nunca sofreu advertência ou outra penalidade durante o contrato de trabalho, nem causou qualquer problema ao empregador. De outro lado, diz que foi apenado por ato praticado em sua vida privada, durante o intervalo intrajornada e fora do local de trabalho.

Em seu voto, o relator lembrou que o mau comportamento é um evento da vida privada que acaba por refletir e prejudicar a esfera profissional. Mas, segundo o magistrado, esse reflexo não pode ser presumido, deve ser concreto e direto, de modo a afetar ou mesmo impossibilitar a continuidade do contrato de trabalho.

E para o relator, a conduta apontada nos autos não tem o poder de impossibilitar a continuidade do contrato de trabalho, que durava mais de cinco meses à época dos fatos, sem qualquer mácula anterior. Isso porque, de acordo com o desembargador, o episódio ocorreu durante o intervalo intrajornada, quando o empregado não está à disposição do empregador. “Ou seja, constitui-se em ato da vida privada do empregado que não compromete o cumprimento de suas obrigações laborais, sendo esse o único fato que levou a empresa a demitir o obreiro por justa causa”. Além disso, salientou o relator, o simples porte, em tese, não traria efeito algum sobre a relação empregatícia.

Valor social

O relator lembrou que o direito de o empresário obter lucro mediante a utilização da mão de obra alheia só se viabiliza – além do respeito à dignidade da pessoa humana – levando em conta a função social da propriedade e observando o valor social do trabalho, conforme prevê a Constituição Federal, em seu artigo 1º (inciso IV), artigo 5º (inciso XXIII) e artigo 170 (inciso III).

Nesse sentido, a Lei 11.343/2006 estabeleceu proteção ao usuário de drogas no intuito da prevenção e da reinserção social, sendo imperativo compreender que o uso ou porte de maconha no horário do intervalo intrajornada, fora do ambiente de trabalho, sem outros reflexos diretos no contrato de trabalho, não pode ser apenado com dispensa por justa causa na forma do art. 482, “b”, da CLT. Outra interpretação, ressaltou o desembargador, levaria ao reconhecimento de dispensa arbitrária a ferir, também, objetivos da República, dentre eles “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Educação

Para o relator, a finalidade pedagógica do exercício do poder diretivo do empregador poderia autorizar uma outra penalidade, além de procedimentos educativos no intuito de resgatar o trabalhador, mas a aplicação da penalidade disciplinar máxima configura, ao contrário, a exclusão, num momento de tamanha vulnerabilidade.

“Se penalmente, o simples usuário é tratado com maior condescendência, com mais razão ainda deve ocorrer no âmbito da relação de trabalho”, concluiu o relator ao votar pelo provimento parcial do recurso, revertendo a justa causa e determinando o pagamento das verbas rescisórias devidas.

Fonte: AASP

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