
Distinguishing no STJ: O Papel dos Embargos de Divergência na Uniformização Jurisprudencial
- Em 18 de junho de 2024
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), os embargos de divergência têm a função de uniformizar a jurisprudência interna. Esse recurso é utilizado quando há divergências nos entendimentos jurídicos entre os colegiados do tribunal sobre o mesmo assunto e a mesma legislação federal.
Segundo o ministro Jorge Mussi (EAREsp 1.433.813), “os embargos de divergência são um recurso de fundamentação vinculada, o que significa que seu conhecimento exige a demonstração clara do dissídio entre o aresto questionado e o acórdão paradigma, através do chamado cotejo analítico”.
Este recurso surge da necessidade de manutenção de uma jurisprudência estável, íntegra e coerente (art. 926 do CPC), incumbindo aos Tribunais Superiores, como medida de preservação da segurança jurídica, julgar fatos idênticos de uma mesma maneira, orientando as decisões dos tribunais inferiores.
Contudo, este recurso possui vários critérios de admissibilidade e de demonstração do dissídio jurisprudencial alegado.
Inicialmente, a decisão monocrática não pode ser utilizada como decisão paradigma para comprovar o dissídio jurisprudencial, a decisão deve ser colegiada.
Além disso, não se mostra suficiente apenas transcrever as ementas e excertos de julgados, é necessário que haja argumentação que aborde de forma suficiente a similitude fática e jurídica entre os julgados.
Sob o mesmo contexto, ao julgar o EAREsp 1.521.111, a Corte Especial, ao interpretar o artigo 1.043, parágrafo 4º, do CPC e o artigo 266, parágrafo 4º, do Regimento Interno do STJ, determinou que é essencial para comprovar a alegada divergência jurisprudencial que a petição dos embargos de divergência adote uma das seguintes medidas em relação aos paradigmas indicados:
- a) Inclusão de certidões;
- b) Apresentação de cópias completas dos acórdãos mencionados;
- c) Citação do repositório oficial, autorizado ou credenciado onde os julgados foram publicados, inclusive em mídia eletrônica; e
- d) Reprodução do julgado disponível na internet, com a indicação da fonte on-line correspondente.
É importante observar o rigor técnico destes embargos, pois a falta de qualquer requisito pode levar ao não conhecimento do recurso, uma vez que, ao contrário, do artigo 932, parágrafo único, do CPC, não há possibilidade de emendar a peça;
Quanto aos julgados que podem ser utilizados como paradigma na discussão da divergência, a Corte Especial, no caso EAREsp 573.866, afirmou que não é permitido utilizar acórdãos de ações que tenham natureza de garantia constitucional, como habeas corpus, recurso ordinário em habeas corpus, mandado de segurança, recurso ordinário em mandado de segurança, habeas data e mandado de injunção.
Além do mais, o artigo 1.043, parágrafo 3º, do CPC permite embargos de divergência quando o acórdão paradigma for da mesma turma que proferiu a decisão embargada, desde que sua composição tenha mudado em mais da metade dos membros.
Prosseguindo, para a admissão dos embargos de divergência, também é necessário que a divergência jurisprudencial entre os órgãos fracionários seja atual. Em outras palavras, não é possível demonstrar a divergência através de acórdão paradigma de anos atrás.
Importante observar que os embargos de divergência são cabíveis apenas quando os acórdãos, embargado e paradigma, dirimirem o mérito da questão, ou seja, os acórdãos cotejados devem exibir idêntico grau de cognição.
Sendo assim, se o acórdão embargado ou paradigma não houver adentrado o mérito em virtude da súmula 7 STJ, não são cabíveis os embargos de divergência, pois neste caso não houve análise de mérito.
Isto ocorre porque a missão do STJ é justamente uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional, o que não haveria no caso de discussão de questões processuais do recurso posto a julgamento.
Há, ainda, a necessidade de distinguishing entre o acórdão embargado e a jurisprudência dominante do STJ: trata-se da técnica de distinção entre o precedente e o caso concreto em julgamento.
Neste caso, é necessário demonstrar as particularidades existentes que permitem excepcionar a tese firmada pela jurisprudência, restringindo-se ou afastando sua aplicabilidade.
Como exemplo desta técnica, o inciso VI, § 1º, artigo 489 CPC, estabelece que no caso de não aplicação pelos tribunais inferiores das súmulas e jurisprudências, é necessário que o órgão julgador detalhe as razões de distinção do caso concreto.
“Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
(…)
- 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.”
A regra deve ser entendida, em primeiro lugar, no sentido de ser viabilizada oportunidade prévia para manifestação das partes acerca da aplicação do precedente no caso concreto. Trata-se de mais uma dentre tantas aplicações expressas do princípio da cooperação que o CPC traz genericamente no art. 10, abaixo:
“Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.”
Logo, Inicialmente, a aplicação de um precedente judicial só pode ocorrer após a utilização da técnica de distinção (distinguishing).
Faz-se aqui uma crítica aos julgados do STJ: a aplicação de uma tese pacificada do STJ a outra situação não é automática, pois deve resultar de uma análise cuidadosa dos aspectos fáticos e jurídicos das situações comparadas para determinar se o caso em julgamento é análogo ao precedente.
O que se observa, na atualidade, são julgamentos quase que automatizados quando há a incidência de temas recorrentes, sem que se faça o cotejo fático entre o acórdão embargado e o suposto paradigma.
Há a necessidade de segurança jurídica também através da distinção entre casos que não são idênticos e merecem tratamento jurídico distinto.
Por fim, longe de não se observar a devida importância da função precípua do STJ de pacificação da jurisprudência, também se faz necessária a devida distinção entre os casos que não se assemelham aos julgados pacificados pelo Tribunal Superior, sob pena de ferimento de princípios de igualdade entre as pessoas e a própria justiça da decisão.
Resumo: O texto traz a abordagem sobre um recurso julgado pelo STJ quando há decisões diferentes sobre um mesmo fato. Portanto, a função do STJ neste recurso é dizer qual decisão deve prevalecer para aquele caso, conforme o entendimento pacificado do STJ, porém, com a necessidade de analisar se as circunstâncias fáticas são as mesmas.
Legenda Zero juridiquês:
Jurisprudência é o conjunto de decisões precedentes de um órgão julgador, no exercício da aplicação da lei, versando sobre um determinado tema, que servem como base para novas decisões.
Colegiado – grupo composto de 3 ou mais julgadores.
Aresto – decisão de um Tribunal.
Dissídio jurisprudencial – quando a parte demonstra a existência de teses jurídicas distintas acerca da aplicação do mesmo dispositivo legal sobre fatos idênticos.
Decisão monocrática – proferida por apenas 1 julgador.
Ementa – decisão resumida com os pontos essenciais.
Paradigma – decisão modelo.
Súmula – um verbete que registra a interpretação pacífica ou majoritária adotada por um Tribunal a respeito de um tema específico, a partir do julgamento de diversos casos análogos.
Como o PMA pode ajudar?
O PMA pode realizar a condução de demandas até os tribunais superiores, tanto em prol do autor como do réu, utilizando-se do recurso de embargos de divergência para aplicação ou afastamento de decisões pacificadas pelo STJ, conforme o caso.
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Por Bruna Braghetto, Advogada, Palestrante e Instrutora In company.
MBA em Direito Corporativo, Compliance e Pós-Graduada em Processo Civil e Direito Civil pela Escola Paulista de Direito.
Graduação em Direito pela Universidade Católica de Santos.
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